Três motivos levam o Brasil a ponderar a retaliação aos EUA com a quebra de patentes

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Brasília – A tensão entre o Brasil e os Estados Unidos poderá aumentar após a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro a mais de 27 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado. O chefe da diplomacia norte-americana, Marco Rubio, disse que o país responderá “adequadamente” à “caça às bruxas” contra Bolsonaro.

A depender da escalada da resposta, o governo Lula será pressionado a mostrar alguma reação. No fim de agosto, por exemplo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou o Itamaraty a acionar a Câmara de Comércio Exterior (Camex) e iniciar consultas para aplicar a Lei de Reciprocidade Econômica contra os EUA.

Além do aumento de tarifas para produtos dos EUA, uma das possibilidades previstas é a de suspender os direitos de propriedade intelectual – a “quebra de patentes” de produtos. Mas não será tão simples e, hoje, a chance de aplicar tal regra é remota.

A “quebra de patentes”, caso seja adotada, ocorreria principalmente no setor de medicamentos, levando o Brasil a autorizar laboratórios nacionais a produzir e comercializar um determinado produto sem a autorização de quem tem a exclusividade para a produção.

Integrantes do alto escalão do Planalto, segundo apurou o NeoFeed, são contrários à medida por, pelo menos, três motivos (todos levam ao risco de o presidente Donald Trump escalar ainda mais a guerra comercial com o Brasil).

O primeiro ponto é que, mesmo que houvesse uma quebra de patentes, o Brasil teria que ter tecnologia imediata para produzir o produto genérico, o que não é tão rápido, num processo que pode levar anos, cortando fornecimento e atendimento para a população.

Uma alternativa, nesse caso, seria recorrer a outros países, como a Argentina ou a Índia, por exemplo, que poderiam ter oferta de remédios. Mas a aposta não é tão segura e envolveria negociações complexas – sem contar com o receio do vendedor estrangeiro ser retaliado por Trump na sequência, comprando uma briga que não é deles.

O segundo é o processo de judicialização por parte de pacientes para a compra pelo Ministério da Saúde de medicamentos de doenças raras. Ao, eventualmente, quebrar as patentes desses remédios, o governo teria que suprir a demanda sem alternativas.

Por fim, a avaliação de governistas é que o governo já tem disputas suficientes com big techs e fintechs. E, no caso das patentes, ganharia mais um inimigo de grande porte: a indústria farmacêutica, com influência no cenário econômico e político no Brasil.

“Retaliar a partir da suspensão dos direitos de propriedade intelectual é um tiro no pé”, diz José Graça Aranha, advogado e ex-diretor da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), uma agência das Nações Unidas.

“Tem uma questão histórica: o Brasil nunca deu muita importância a esse tema, incluindo aí o próprio Instituto Nacional de Propriedade Industrial”, afirma Graça Aranha. “Retaliar com quebra de patentes além de ser um erro será mais uma fonte de atrito.”

O advogado avalia que os laboratórios nacionais teriam dificuldade de reproduzir um medicamento mais sofisticado em tempo hábil para a substituição. “Isso leva anos, vai acabar não funcionando e só vai dificultar o nosso ambiente de negócios.”

Ainda em 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o Brasil quebrou a patente de um dos medicamentos do coquetel anti-Aids, o Nelfinavir. Em 2007, no governo Lula, houve nova suspensão, daquela vez para o Efavirenz, também para a AIDS. O remédio genérico então passou a ser importado da Índia.

Para Graça Aranha, os casos anteriores não se enquadram no atual momento. “A alternativa neste momento ainda está na negociação para evitar danos maiores.”

Fique Por Dentro

Quebra de patentes criaria atritos com a indústria farmacêutica

Laboratórios nacionais não têm tecnologia para produzir rápido

Recorrer a outros países envolvia riscos e negociações complexas

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